A Matemática A - disciplina da formação específica, trienal, obrigatória, dos cursos científico-humanísticos de Ciências e Tecnologias e de Ciências Socioeconómicas do Ensino Secundário - precisa de ter o seu papel bem esclarecido.

No programa da disciplina lembra-se que é “este o ramo da Matemática do Ensino Secundário que dá acesso aos cursos do Ensino Superior de áreas que requerem uma sólida formação matemática”, enquanto se esquece que este ramo da Matemática do Ensino Secundário também dá acesso a outros cursos do Ensino Superior de áreas em que a formação matemática tem um caráter menos estruturante.

No contexto do novo programa de Matemática A, alterado à margem de todo o enquadramento do Ensino Secundário, o «A» parece caracterizar uma visão da Matemática que os alunos devem aprender que os prepare para a Matemática do Ensino Superior. O programa prescrito a uma percentagem muito significativa de alunos do Ensino Secundário pretende ser um programa de Matemática A-vançada?

Numa altura em que se perspectivam mudanças estruturais no Ensino Secundário e com uma abrangência para além do domínio mais restrito da Matemática, e em que são cada vez mais necessárias outras alterações, no imediato, para minorar a confusão instalada por conta do novo programa, é importante clarificar o papel da Matemática (A).

A Matemática A, deve ser uma disciplina com uma filosofia mais A-brangente e menos A-vançada… uma vez que se trata do plano de estudos de uma percentagem significativa de alunos, é necessário garantir um conjunto de competências matemáticas que privilegiem a amplitude do conhecimento matemático em detrimento do aprofundamento de um ou de outro tema. A tentativa de conciliar a abrangência com a profundidade está a comprometer a abrangência, porque alguns temas são suprimidos pelo incumprimento, e a profundidade também fica em causa, porque alguns temas são tratados de forma inconsistente para que se consigam abordar mais temas. O Ensino Secundário, incluindo a disciplina de Matemática, tem que ser aliciante e acessível para um número significativo de jovens. De nada servirá criar um espaço curricular para a Matemática Avançada se não houver um número suficiente de alunos que dele possa, ou queira, usufruir.

Talvez seja necessário garantir a existência de um programa de Matemática Avançada para os alunos que revelem motivação, competência ou necessidade desse aprofundamento. Talvez uma disciplina optativa, ou de substituição da Matemática convencional deva ser equacionada na próxima reforma do Ensino Secundário… Talvez este espaço de valorização formal da Matemática (ou da Matemática na sua vertente mais formalizada) seja importante para alguns alunos do Ensino Secundário.

Mas, no atual contexto, a miragem da generalização de uma Matemática Avançada, está a produzir mais retrocessos que avanços… a opção por uma Estatística que se faz só na folha de papel e não na folha de cálculo, o estudo da Geometria centrado em fórmulas e procedimentos em detrimento da valorização dos problemas ou do papel da visualização, a escolha de uma visão da Álgebra e das Funções em que as aplicações só podem ser tentadas em contextos teóricos complexos e com um formalismo assustador, está a criar um cenário onde se adivinha um aumento do insucesso, o afastamento de um conjunto “não negligenciável” de alunos destas áreas de estudos com eventuais implicações futuras na falta de estudantes nas áreas científicas com que já se debatem vários países desenvolvidos.

primeira versão deste texto foi originalmente publicada na rubrica Valor Absoluto do Clube de Matemática da SPM, em 11 de maio de 2016.