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Novo programa, práticas velhas

Na década de 70, do século passado, em Portugal (e noutros países) fez-se uma experiência com o currículo de matemática que ficou conhecido pelo nome de “matemática moderna”. Tratava-se de um programa com rigor e abstração sem precedentes, prescrito a alunos muito jovens... era inovação pura! Experimentou-se! Correu mal! Antes do fim da década o currículo foi reformulado no sentido de prescrever um currículo com menos conteúdos, organizando melhor o trabalho de alunos e professores.

A década de 80 foi um período relativamente calmo, sem sobressaltos, do ponto de vista do currículo da matemática.

A década de 90 começou com uma reforma curricular, ao nível do ensino secundário, caracterizada por um currículo “moderno”... mais ambicioso, que supostamente prepararia melhor os alunos. O caos instalou-se... professores diferentes tratavam temas diferentes, com aprofundamentos diferentes tentando adivinhar os conteúdos abordados nos exames e o tipo de abordagem pretendido. Antes do fim da década o currículo foi reformulado no sentido de prescrever um currículo com menos conteúdos, organizando melhor o trabalho de alunos e professores.

A primeira década deste século foi um período relativamente calmo, sem sobressaltos, do ponto de vista do currículo da matemática.

A década atual propõe uma reforma curricular, ao nível do ensino secundário, caracterizada por um currículo “moderno”... mais ambicioso, que supostamente preparará melhor os alunos. Aposto que consegue adivinhar como se irá (daqui a uns anos) escrever o final deste parágrafo...

A inovação enfrenta sempre alguma inércia... fazer diferente é sempre arriscado. A inovação curricular não é diferente. Quando se experimenta uma nova abordagem curricular, tudo pode correr mal... e normalmente muitas coisas correm mesmo mal. Por esse motivo as experiências curriculares devem ser implementadas progressivamente, de forma bem preparada, acompanhada e avaliada. Os erros surgem por nunca ninguém ter tentado fazer daquela forma, por não ser possível prever tudo o que pode correr mal. Mas quando os erros que já foram identificados, quando já se sabe que o caminho escolhido não nos leva ao destino pretendido, os erros não são aceitáveis. Fazer alterações curriculares com (muitas) semelhanças a outras que correram mal, não é inovar. Não precaver erros esperados, não preparar a introdução de alterações profundas, não negociar as alterações com os professores e com os especialistas, impor ideias muito pouco sustentadas... é cometer erros – velhos! Outra vez!

Costumo incentivar os meus alunos a mostrarem os seus raciocínios no quadro, mesmo quando têm erros. Costumo incentivá-los a exporem os seus raciocínios, com erros, com o objetivo de que não os voltem a cometer... digo-lhes que errar é um processo normal decorrente da falta de experiência... mas voltar a cometer os mesmos erros já é menos desculpável, pode decorrer da falta de atenção, ou de memória... cometer os mesmos erros de forma repetida, deve decorrer... do facto de atravessarmos uma época ímpar (refiro-me, naturalmente, ao algarismo das dezenas dos anos em que vivemos).

primeira versão deste texto foi originalmente publicada na rubrica Valor Absoluto do Clube de Matemática da SPM, em 11 de novembro de 2013.
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