
No dia a dia, muitas das empresas que recrutam empregados avaliam no perfil de cada um as suas capacidades técnicas e cognitivas e as suas capacidades pessoais. As primeiras são denominadas de hard skills e as segundas de soft skills. Recentemente, li um artigo que me despertou a curiosidade sobre estas soft skills pois tinha ouvido falar sobre elas, desconfiava do que seriam, mas nunca tinha investigado o que realmente seriam.
As soft skills empregam um conjunto de capacidades que se desenvolvem no individuo ao longo da sua vida e que, dito de uma forma corriqueira, não se aprendem nos livros. Adquirem-se com as nossas experiências pessoais. Existem uma lista imensa de soft skills, mas o que me faz escrever este texto é refletir sobre como as desenvolver através das aulas de Matemática e da própria Matemática em si.
Comecemos pois:
Talvez a principal soft skills a se desenvolver com a Matemática. O domínio da técnica da resolução de problemas é uma das capacidades pessoais a serem valorizadas pelos empregadores ou não fossem existir problemas para resolver em todas as áreas da nossa sociedade. A Matemática apresenta-se como a disciplina “mãe” da resolução de problemas, pois é através das tarefas que damos aos nossos alunos que eles aprendem a analisar uma determinada situação problemática, a refletir sobre os vários possíveis planos de resolução do problema e a executar a resolução que parece ser ideal para a situação apresentada. Ou seja, nada como contar com os professores de Matemática para aprender esta soft skill.
Esta poderá vir por acréscimo da resolução de problemas. É essencial termos a capacidade e o espírito crítico de perceber o que correu bem, o que correu mal e o que poderá ser melhorado. O Pensamento Crítico passa muito também por perceber se a solução do problema que encontramos corresponde realmente aquilo que se pretende ou se poderá haver algum tipo de falácia nessa mesma solução. Acho que não poderemos duvidar de já ter visto isto em algum momento nas nossas aulas, não?
A capacidade de imaginarmos vários cenários de resolução de problemas e dar resposta a uma determinada situação problemática contribui para o desenvolvimento deste conhecimento pessoal. Há que valorizar a diversidade, o responder diferente, o fazer de várias formas e o descobrir de novos e audazes caminhos. A criatividade também é desenvolvida na Matemática e não é só uma capacidade das disciplinas das Artes.
Não há tarefas mais difícil do que concretizar o abstrato. E a comunicação na Matemática poderá envolver essa tarefa. Porque o 2x+3 tem significado e é necessário explicá-lo no contexto do problema e para explicar é precisa boas capacidades de comunicação. A comunicação do porquê, do como, do quê, do como poderá ser... Tudo isto poderá estar e deverá estar nas aulas de Matemática e é importante valorizar estes problemas.
Tendo em conta as imensas situações que poderão surgir e explorar no trabalho desenvolvido na Matemática, a capacidade de se ser flexível surge naturalmente em contexto de sala de aula. Na Matemática, trabalha-se em contexto geométrico e artístico, em contexto financeiro, em contexto doméstico, em contexto científico, etc. Além disso e noutra perspetiva, os pressupostos de trabalho podem ser sempre diferentes, visto que há a possibilidade de trabalhar experimentalmente, tecnologicamente, em grupo, individualmente.... Qualquer variável pode e deverá ser mudada regularmente para que a flexibilidade dos alunos possa ser ainda maior e mais abrangente. Ou seja, tudo poderá ser abrangido e explorado pela Matemática e todas as variáveis de trabalho poderão ser alteradas.
Estas são as soft skills que eu decidir destacar. Mas claro que existem muitas mais e conseguiríamos arranjar sempre algum momento e alguma situação em que a aula de Matemática poderia entrar.
Com isto, não estou a desvalorizar as hard skills. Afinal de contas, convinha que determinado funcionário saiba o que está a fazer e com que está a lidar quando realiza o seu trabalho. Mas, um determinado trabalho só é bem executado se o funcionário que o executa sabe o que faz, sabe com o que está a lidar e é bom a gerir todo o que a situação envolve.
Cabe-nos a nós, Professores de Matemática, assumir as responsabilidades de desenvolvermos nas nossas aulas o máximo de soft skills possíveis nos nossos alunos. Pois de certeza que um dia em que eles passem por nós na rua, irão nos reconhecer como Professores do verdadeiro saber e não como Professores da resolução de Equações e de Regra de Três Simples.